Olá, tudo bom? Eu sou a Érika e trouxe mais uma vez um texto para vocês! Espero que gostem.

Essa terra não era para todos

Segundo conta a tradição, um anjo de deus dividiu o universo e a humanidade em duas. A primeira formou a sociedade moral e justa em que habitamos hoje. Entretanto, a fim de manter o equilíbrio cósmico, o segundo universo concentrou todo o mal. Neste local paralelo, há relatos de que a injustiça, a corrupção, a guerra e demais aspectos egoístas permeiam aquela realidade. É justamente nessa última dimensão que Maria e João moravam.
Eles estavam desempregados. Não por incompetência. Também não era mais uma consequência da crise econômica. O real motivo era o posicionamento político deles. Oposição. Exatamente por isso, o príncipe acreditava que eles não mereciam o mesmo tratamento que os outros. Afinal, essa terra não era para todos.
Se fosse apenas por causa de Maria e João, não haveria tanta preocupação da parte deles. Contudo, naquele lar, ainda habitava duas pequenas crianças, que tinham necessidades como qualquer outra. Precisavam alimentar-se bem, estavam em fase de crescimento. Necessitavam estudar, ter acesso à saúde e à própria leveza que aquela idade deveria ter. Mas, talvez, tudo isso fosse luxo demais.
Por isso, as criancinhas, Ana e Isa, estavam à mercê da própria sorte. Até porque tudo que a Monarquia fornecia, embora cobrasse impostos demasiados, era precário. Na escola, as estruturas caiam aos pedaços e o conhecimento não se propagava por aquelas mentes, já que havia um velho guardião protegendo a popularização do saber. Esse senhorzinho pagava mal aos funcionários e permitia que a escola fosse sucateada. A esperteza dele não se restringia a isso. Ele conseguiu, ainda, fazer com que todos pensassem que o grande vilão fosse o professor.  Assim, a comunidade começou a imaginar que esses eram verdadeiros ditadores e marxistas impiedosos. Infelizmente, Ana e Isa estavam juntas nessa roda-gigante que parecia nunca parar.
Num dia frio, entretanto, Ana começou a aumentar a temperatura corporal, alcançando um estado febril. Posteriormente, veio o vômito e as dores abdominais. Seus pais, extremamente preocupados, a levaram para o posto mais próximo. Contudo, ele estava fechado porque o monarca havia desviado o dinheiro daquele local. Segundo os boatos, essa verba rendeu muitas festas e viagens particulares.
Então, apreensivos, direcionaram-se ao hospital no carro de um vizinho. Afinal, não havia ambulância e eles não tinham dinheiro para o deslocamento. Porém, aquela alternativa não foi tão gratificante. O hospital estava lotado e somente um médico atendia. Isso porque o outro preferia trabalhar em sua própria clínica, rendia-lhe mais.
Assim, sendo mais uma entre tantas emergências, Ana não resistiu. A autópsia mostrou que o seu apêndice rompeu-se. O tempo de espera foi grande demais. Seus pais choraram. Sua querida irmã também. Isa estava desconsolada, havia perdido sua melhor amiga, sua irmãzinha.
Maria tentando acalmar a sua filha que ainda sobrevivia, contou-lhe que Ana agora estava em um lugar onde nuvens gotejam chocolate, onde não havia fome nem tristeza. Um ambiente tão maravilhoso que as crianças brincavam todas unidas, independente da crença e da cor. Assim, Isa pela primeira vez parou de chorar e invejou sua irmã.
Esse caso saiu nos jornais. A sociedade chocou-se. Mas, o príncipe da vila dormiu tranquilamente. O médico, em paz. A sociedade se revoltou. O príncipe e o médico acordaram tranquilamente. E a sociedade se esqueceu. 


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